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Ela não gosta de mim... mas é porque eu sou burro
I – A Lei de Gerson: "Tenho que levar vantagem em tudo":

Numa tarde do ano de dois mil e onze, dei-me conta de que o telefone da sala da minha casa estava quebrado, como se espera de um telefone sem fio, que, geralmente, possui uma vida útil curta.

Conectei-me à internet e, num site de comparação de preços, comecei a pesquisar por "telefone sem fio". Encontrei um telefone muito barato, que custava menos de trinta reais! É claro que optei por ele.

Caso o aparelho fosse uma porcaria e durasse somente alguns meses, mesmo assim, eu já sairia no lucro. Só estranhei a caixa do produto: a imagem ilustrativa era um pirata. Ignorei a esquisitice, taquei o meu cartão de crédito lá, digitei os números e mandei ver na compra.

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II – A Lei de Murphy: "Se algo pode dar errado, dará":

Transcorrida uma semana, o zelador do prédio interfonou pro meu apartamento, informando-me que, na portaria, havia um sedex pra mim.

Desci até lá, peguei a correspondência e retornei. Abri o envelope e… opa! Que merda é essa? Um livro?

Qual não foi a minha surpresa quando descobri que comprei um livro infantil! Era um exemplar de "Telefone Sem Fio" do conceituado escritor Ilan Brenman.

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III – A Lei do Bozo: "Sempre rir!":

Como é meu hábito, não dei soco na parede, não amaldiçoei o universo e nem chorei de raiva. Apenas ri! Gargalhei demais! Desfrutei o paladar da euforia saborosamente como um idiota!

Não existe jeito mais delicioso de rir do que se esgoelando como um retardado! É muito bom ser ridículo! É bastante prazeroso ser capaz tirar um sarro de si próprio! Isto é virtuoso!

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IV – A Lei de Abraham de Moivre: "A soma de uma grande quantidade de variáveis aleatórias tende a uma distribuição normal":

Confessei a minha cagada pra minha mãe e ela riu também.

Mamãe é coordenadora pedagógica de uma escola e, por coincidência, o autor da supracitada obra é pai de um ex-aluno que estudou lá.

Minha mãe admira o trabalho de Ilan Brenman e costuma adotar os livros dele pra usá-los didaticamente. Como ela ainda não tinha aquele título, mostrou interesse e disse que poderia ficar com o livro.

Sendo eu muquirana pra cacete, vendi o livro pra minha mãe. Depois concluí que teria sido mais elegante embrulhá-lo e guardá-lo pra presenteá-la no dia das mães. A economia seria a mesma, entretanto, com fineza, poupando-me de cair na grosseria.

Cafona, ingênuo, lunático e mão de vaca, tudo bem, eu posso ser. Mal educado, não.

Descortesia à parte, o padrão da circunstância foi reestabelecido e permaneceu tudo "elas por elas".

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V – A Lei de Lamarck: "O pescoço da girafa cresceu para adaptar-se ao habitat e alcançar o topo das árvores":

Após uma quinzena, Ilan Brenman foi dar uma palestra na escola de mamãe. A senhora Regina, minha mãe, relatou a história da minha asneira estúpida pro escritor.

O rosto de Brenman corou-se de satisfação com o deleite da narrativa. A menininha de seus olhos pulou de alegria no interior de seu globo ocular e ele mandou essa:

– Que causo genial! Vou contar pra todo mundo! Quá… quá… quá… quá… quá!

Ele rachou o bico pra valer! E completou:

– Seu filho deve ter pensado: "Nossa! Que telefone baratinho!".

A partir de então, o senhor Ilan Brenman comenta sobre a minha peripécia em todas as suas conferências. Isto é uma honra pra mim!

Está certo que eu virei um personagem bizarro, motivo de chacota pra entreter o público e deixar o ambiente mais leve, possibilitando que Brenman utilize-me como piada, antes de enveredar por assuntos realmente sérios. Divertindo-se às minhas custas, a plateia queda-se mais receptiva à explanação do orador. Mas que se dane, bicho! Estou orgulhoso e pronto!

Moldei a minha experiência e adequei-a à prática. Minha consciência foi alongada.

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VI – A Lei de Newton: "Para cada ação, há sempre uma reação oposta de igual intensidade":

A única coisa ruim foi que a minha namorada da época, a Dani, era muito bravinha e intolerante. Levava os fatos pelo lado negativo, era dona de um controle emocional escassamente desenvolvido e dispunha de pouco senso de humor.

Como eu vivo com a cabeça nas nuvens, esqueci-me destes detalhes...

No dia em que eu recebi a encomenda indesejada, fui ao motel com ela. No caminho, falei que fiz uma burrada e expliquei o ocorrido.

Supus que a Dani consideraria o acontecimento cômico, assim como eu, minha mãe e, posteriormente, inclusive, o próprio autor. Porém, ela não achou graça nenhuma. Fez cara feia, deu-me uma bronca e sentenciou que eu era um jumento cretino que queimava dinheiro e tinha mais é que se ferrar.

Segundo a minha querida amada, se eu morresse, não haveria nada mais justo, ninguém perceberia a minha ausência e o Planeta Terra passaria bem sem mim, além de que eu seria acolhido no seio do local onde eu merecia morar eternamente: a profundeza dos infernos. Mais peculiarmente, num quartinho especial reservado aos lerdos e paspalhos no qual as chamas ardem mais fortes.

Como se não bastassem os vinte e cinco minutos de xingamentos, ela ainda arrematou gritando que não conseguia sentir tesão por homens patetas e que não iria mais ao motel comigo. E foi embora. Vixi!

Mingau Ácido (Marcelo Garbine)

A versão em animação digital pode ser vista na seção Desenhos Animados deste site.

A versão em áudio deste texto – transmitida pela Rádio WRA de Santo André – SP – e pela Rádio Além Fronteiras de Portugal – pode ser ouvida na subseção Crônicas para Rádio da Seção Rádios deste site.

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Ilustração de Nanci Penna

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